segunda-feira, 10 de junho de 2013

A Surpreendente Historia da Casa sem Porta




Eu sempre fui um exemplo de padrasto. Servia de paradigma para muitos. Eu amava aquelas crianças como se fossem meus filhos. A Caroline e o Felipe eram as crianças mais doces do mundo. Porém, eles sabiam que eu não era o pai legítimo, e sabendo disso, sempre soltavam esta verdade quando eu os proibia de fazer algo. Eu os pegava e os colocava de joelhos no milho solto granulado. Os joelhos das crianças ficavam com uma inchação preocupante e sua cor, era a de um azul marinho muito escuro; pediam-me aos prantos que eu tivesse compaixão, porém em debalde. Neste ponto eu era um homem demasiado rude. Três dias depois do castigo, o inchaço virava uma espécie de pústula e a mãe deles, mulher que eu a cultuava como uma santa, espremia aquele carnegão podre que voava feito um jato.

Admito a vocês que eu tinha uma mania pertinente, a bebida. Não obstante, a bebida não era o meu único vício. Comecei a usar drogas destrutivas que me causavam alucinações e viagens paranormais. Eu usava aquelas substâncias com a pretensão de esquecer o homem que matei em uma guerra. Elas me acalmavam os nervos; era a única solução para enfrentar este caso e relevar as travessuras das crianças que sempre quebravam uma de minhas coleções de bebidas que se encontravam na adega.

Minha mulher, como disse antes, era uma santa. Uma mulher resignada. Uma verdadeira mulher submissa ao homem. Ela nunca reclamava das minhas bebidas e de minhas drogas. Porém eu virava o belzebu quando chegava naquela casa e os encontravam trancados no quarto.

Eu rodeava a casa inteira a procura de um objeto para quebrar aquela porta. A porta, no entanto, era de uma madeira bem firme e nunca cedia. Tentei uma vez quebra-la com um botijão de gás, mas o que aconteceu, foi que a porta rachou-se e eu pude ver apenas os rostos dos pestinhas preocupados. A porta era a minha inimiga.

Meus dias de boemia não paravam.

Um certo dia, cheguei em casa cem por cento sóbrio. Não encontrei ninguém na casa. A primeira coisa que pensei foi que a mulher foi embora para a casa de sua mãe. Não me importei de imediato. Passaram-se dois dias. Três dias. No quinto dia eu comecei a me preocupar. A solidão estava me corroendo assim como as bebidas e as drogas.

Porém as drogas já não me acalmavam como antes. Ela me deixa mais apreensivo. Eu tinha que arrumar outro meio de me acalmar. E achei!

A janela do segundo andar tinha uma visão que eu nunca tinha apreciado antes. Nela eu via cada situação. Eu ria da vizinhança cafona que tinha.

No entanto, tinha uma casa muito curiosa, e que jamais a tinha visto antes. Nela, várias pessoas moravam. 

Porém, um fato me deixou intrigado. A casa, surpreendentemente, não tinha portas, apenas janelas.

Como poderiam as pessoas se adentrar ali? Todos os dias eu me fazia a mesma pergunta.
A janela tornou-se o meu cantinho predileto da casa. “Antes era a adega, agora é aqui”, Eu dizia a mim mesmo.

Eu fiquei paranoico com aquela casa. De manhã cedo, o movimento nela já era constante. Às vezes até de madrugada. Eu ouvia vários cantos vindos de lá.

Um dia saí e fui averiguar aquela intrigante casa. Rodeei-la e não encontrei a maldita porta. Procurei algum modo de entrar nela, porém não havia nenhuma ombreira. A janela era bem alta; e qual casa se entra pela a janela? “A entrada só pode ser por um subterrâneo”, conjeturava.

Voltei para a casa com uma dor de cabeça impertinente. Aquela intriga estava me acabando. Eu já nem dormia direito. Confesso que sentia saudades das crianças e da minha santa mulher.

De repente, um som de sino veio do segundo andar da casa. Ao chegar lá, constatei que o som vinha daquela maldita casa sem porta. Pus a cabeça para a fora da janela, e ao olhar para aquela casa sem porta, vi as duas crianças e a minha mulher com os rostos tristonhos e cabisbaixos olhando da janela da casa.  Fiz-lhes um breve aceno, e este não foi respondido.

Não sei por que, mas me veio uma vaga lembrança de que já estive naquele lugar onde eles se encontravam.

No apogeu de minha dúvida e intolerância, um homem, que ignoro o rosto, disse-me:

- Triste por não estar lá?

- Nenhum pouco. – Respondi-lhe.

- Pois deveria. – Disse ele.

- Por que deveria?

- Lá é uma igreja.  E também posso chamar de céu.

- Como assim?

Ele conservou-se mudo.

- Bom, sendo assim, acho que queria estar lá.

- Sabes que não pode né!

- Como não posso? Eles são a minha família. Eu os amo.

- Assassino e suicida não são bem vindos ali. – Disse-me.

- O que quer dizer com isso, sua alma penada?

- Busque em suas reminiscências. – Disse ele com uma voz que soava como um eco estrondoso.

- Não consigo! – Respondi com uma cólera indizível.

De repente lembrei-me de tudo o que aconteceu.


Naquela noite fria e chuvosa em que fiz uma rachadura com o botijão de gás, entrei no quarto e matei-os com a minha pistola, meu precioso instrumento de trabalho.


Por Patrik Santos

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